sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Das artes e das artimanhas

Fui ver a exposição sobre Clarice Lispector no Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília. Além de emocionar pela captação da contraditória relação da escritora com as palavras, a exposição dá acesso a originais de cartas trocadas entre Clarice e vários escritores e intelectuais brasileiros. Há um enorme gaveteiro em uma das salas da exposição e, dentro das gavetas que a gente vai abrindo, há essas cartas - íntimas umas, formais outras -, rascunhos angustiados, fotografias, bilhetes familiares, junto com exemplares das primeiras edições de seus livros. Tudo isso vai descortinando o complexo painel da vida dessa que é a maior escritora brasileira. Por fim, há uma sala de projeção, onde se pode assistir ao vídeo da entrevista concedida por Clarice a Júlio Lerner, em 1977, poucos meses antes de sua morte.


Nessa entrevista, em que aborda os mais variados assuntos, Clarice nos conta, intrigada, de quando foi procurada por um professor de literatura, que lhe confessou que lia e relia
A paixão segundo GH mas não conseguia entender o livro para poder trabalhá-lo com seus alunos. Em contrapartida, conheceu uma menina de 17 anos que lhe declarou ter A paixão... como livro de cabeceira, que, a cada leitura, lhe revelava novos sentidos para a vida. Mas a escritora evita extrair dessa observação qualquer conclusão apressada, como que deixando a resolução de um enigma a cargo do expectador.

Essa mostra fica no CCBB até o dia 14 de março. A entrada é franca. Se você não viu, ainda há tempo.

* * *

E o CCBB inaugura, ainda em março, a mostra de grafites dos irmãos Otávio e Gustavo Pandolfo, conhecidos como
Os gêmeos. Pela amostra, será muito interessante, aguardemos:



* * *
Artimanhas

Leio hoje nos jornais que o agressivo advogado do governador licenciado - e ainda preso - José Roberto Arruda está negociando com a Justiça a sua libertação, em troca de permanecer afastado do governo do DF até que se concluam as investigações da Operação Caixa de Pandora.

Esse escândalo da corrupção no DF está desnudando aspectos inéditos da relação entre criminosos e Justiça... Desde quando esse tipo de negociação é possível? Alguém acredita que, livre em Brasília, ainda que afastado do governo, Arruda cessará suas ações para obstruir as investigações?

Os jornais dão notícia de que houve "racha" entre os advogados do governador. Afastaram-se os "eminentes" juristas de Brasília - quatro ao todo - para dar lugar exclusivo ao escritório do carioca Nélio Machado, notório por atuar em defesa de Daniel Dantas, entre outros criminosos endinheirados menos conhecidos.

Por seu lado, Paulo Octávio, que nesta semana se desfiliou do DEM e renunciou ao cargo de governador substituto, agora está sem pai nem mãe, perdeu a imunidade parlamentar. Mas como diz a sabedoria popular, "rico não vai para a cadeia." Aguardemos para saber como será a defesa de um dos homens mais ricos do DF, dono de uma fortuna amealhada sempre à sombra do poder público, que o beneficiou de todas as formas ilegais imagináveis e por imaginar.

Enquanto isso, a Câmara Legislativa tenta mostrar trabalho, aceitando os pedidos de impeachment do governador licenciado e abrindo processo interno contra três dos oito deputados distritais implicados no esquema, apenas os que foram flagrados pelas câmeras de Durval Barbosa. A CLDF tenta evitar a intervenção federal, que agora é tida como certa. Meio tarde, não? A essa altura, a população de Brasília já sabe que não pode confiar nessas vestais da (i)moralidade pública.

Enquanto isso, o novo governador Wilson Lima vê os fatos desabonadores de seu passado político serem trazidos à tona. E que passado cabeludo, hem, gente? Claro que o jornalismo investigativo sobre ele não está sendo feito pelo Correio Braziliense, que, de tão comprometido, venda os olhos enquanto sua reputação rola esgoto abaixo.

Nenhum comentário: