Cada vez que vou a um evento na Escola Classe 304 Norte volto convencida de que é uma escola pública muito boa. Nela estudaram minhas filhas. Agora estuda minha neta mais velha. Sim, sim, eu sei que o tempo está passando e tenho que pintar o cabelo com cada vez mais frequência. Por isso é sempre bom registrar essas recordações, antes que se percam na areia difusa de um passado que ajudei a escrever.
Eu já narrei AQUI um pouco de minha vivência como mãe de alunas dessa escola, nos anos 80, quando a participação da família foi fundamental para se dar início a um projeto político-pedagógico com foco na gestão democrática e nos princípios da cidadania e da solidariedade.
Hoje, ao voltar lá para a festa junina, fico feliz ao constatar que tais parâmetros ainda norteiam o fazer educacional, o que faz dessa escola um espaço privilegiado para os estudantes poderem construir sua autonomia, em busca da emancipação.
Apenas como exemplo das ações ali desenvolvidas, vejam como foi a gincana solidária promovida antes da festa junina:
Percebem? Nessa atividade não se escamoteia a competição, mas ela é colocada a serviço de outros princípios, tais como o da solidariedade. E a premiação contempla atividades que agregarão valores a esse princípio. Registre-se que a gincana foi assim definida em reunião com todas as turmas, quando os alunos puderam opinar e suas contribuições foram incorporadas à organização do evento.
Para a comemoração junina, com apresentação de quadrilhas e comidas típicas, também houve decisão coletiva, que orientou o trabalho de pesquisa das turmas para a preparação das atividades. Assim foi que uma turma de alunos mais velhos optou por homenagear Luiz Gonzaga, entremeando a dança com a narração da vida desse artista popular, executando a coreografia dos diferentes ritmos de suas músicas: baião, xote, xaxado etc. Tudo isso acompanhado da devida criação plástica:
Já a turminha da Sofia dedicou-se a produzir um mural que dialogasse com a obra do pintor ítalo-brasileiro Alfredo Volpi. Reparem:
Agora comparem com o original:
Vício de vó professora: converso com Sofia para ver o quanto ela aprendeu com essas atividades e me surpreendo. Ela sempre aprendeu mais do que supus.
Fico feliz porque o processo que iniciamos nos anos 80 continua. Como é próprio do fazer educacional, não há como considerar que isso é tudo a ser desenvolvido. Não há finalização possível, porque sempre se agregam mais conteúdos e valores, em um exercício permanente de educação laica, que forma os alunos para a vida. Não qualquer vida: aquela que se faz espaço permanente de crítica, de autonomia, de cidadania.
Nessa escola, o princípio da gestão democrática, do qual estão imbuídos o corpo docente, a direção e o movimento de pais e mães de alunos, nada tem a ver com organizar eventos para arrecadar dinheiro. Ele é mais um momento marcante de integração e de aprendizado, que não se restringe ao espaço intramuros, mas age também sobre a sociedade fora da escola, assim como recebe a influência dessa sociedade e se constitui em lugar de reflexão e questionamento da vida social.
Essa é uma experiência que deve ser socializada e proporcionada a todas as escolas da rede pública de Brasília, não tenho dúvida.
O tema da festa junina foi "Eta trem bão!" Trem bão de festa, trem bão de escola!!!
Um comentário:
Tive o privilégio de ser presidente da Associação de Pais e Mestres dessa Escola, logo após o fim da ditadura. Pude testar neste microcosmo, junto com os professores e outros pais, os limites da abertura que se apresentaram bem aquém das minhas expectativas. Assim como da democracia de hoje que só agora incorpora o econômico e convive com um judiciário elitista, anti-popular e ritualizado. Vivi naquela época uma experiência marcante que foi a injusta demissão da dedicada e democrata diretora Beth que teve o "desplante" de, numa greve, ficar do lado dos seus colegas professores e dos pais dos seus alunos que apoiavam aqueles trabalhadores da educação.Naquele contexto aprendi mais que as minhas filhas que lá estudavam: lições que guardo comigo e procuro atualizar.
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