Trata-se da escola pública em que a Sofia, minha neta, vai estudar a partir do próximo ano. Nela estudaram também minhas filhas, nos anos 80 do século passado.
(Ai! como o tempo voa! Já sou uma pessoa que fala com a maior naturalidade de coisas que vivenciei "no século passado"!)
Já naquela época a escola reunia um grupo de pais e mães de alunos muito participativos, preocupados com a qualidade da educação. Mas preocupados, acima de tudo, em que a escola se tornasse um espaço não de reprodução das relações sociais, e sim de questionamento permanente dessas relações. Não queríamos a escola que "padronizasse" nossos filhos, mas que nos ajudasse a dar-lhes uma formação cidadã, crítica e autônoma. Notem: isso foi lá pelos idos de 1985-88.
Houve boas brigas. Fomos a primeira Associação de Pais e Mestres a utilizar o instrumento jurídico da ação popular, instituída pela Constituição de 1988, para obrigar o governo do DF a negociar com o Sindicato dos Professores, em greve havia 45 dias. O difícil foi desmentir a imprensa local, que dizia ser essa uma iniciativa para acabar com a greve, contrária ao movimento dos professores. Nossa APM também resistiu contra a exoneração da diretora da escola, nossa querida e comprometida Bete, rechaçando a vinda de uma interventora nomeada na calada da noite pela então Fundação Educacional do DF. Foram muitas reuniões, muita discussão, muitas idéias, muitas iniciativas inovadoras. Não me queixo daqueles anos: graças a esse movimento minhas filhas se tornaram boas leitoras, críticas, politizadas e sensíveis.
Mas vamos ao Pacheco. Ele foi diretor da Escola da Ponte, em Portugal, desde sua criação, em 1976, até há pouco mais de dois anos. Não preciso falar aqui dessa escola, já por demais conhecida pelos educadores brasileiros. Suas palestras são muito concorridas, professores e estudantes gostam de ouvi-lo falar, empolgam-se com o relato de suas vivências, de como se tornou educador "por vingança", de como a escola que dirigiu deixou de ser "um lixão" para se consagrar como modelo de uma educação emancipadora, trabalhando com conceitos libertários de disciplina e responsabilidade, enfrentando a violência presente no dia-a-dia das comunidades excluídas. Pacheco fala com muita convicção, com muita paixão, com forte embasamento crítico-teórico.
Ao final da palestra, fui tomada por aquela sensação de estar conhecendo pessoalmente alguém com quem vinha mantendo, pela leitura de seus textos, sintonia fina, desde muito tempo. A sensação de conhecer aquele professor, de compartilhar suas expectativas, de ser solidária com sua história, com sua formação de esquerda, com suas propostas para a educação. E não pude resistir a uma pergunta emocionada:
- Onde é que você estava em dezembro de 1985, quando um grupo de jovens pais e mães de alunos desta escola iniciava intuitivamente uma revolução na forma de educar seus filhos?
Hoje, 25 anos depois de vivenciar tantas angústias, tantas dúvidas, tanta insegurança e de lutar com convicção contra a educação que tínhamos certeza de não querer, vejo que não tivemos José Pacheco - ocupadíssimo em revolucionar a educação em Portugal -, mas vieram em nosso socorro Paulo Freire, Anísio Teixeira, Darci Ribeiro, Demerval Saviani e Lauro de Oliveira Lima; com este último aprendi que "o homem está em permanente reconstrução: por isso é livre: liberdade é o direito de transformar-se".
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