terça-feira, 1 de outubro de 2013

"As mais longes do mar"

Esse é o título de um livro de fotografias de Brasília. O autor-fotógrafo é Truman Macedo, cearense-brasiliense de longa data.

O livro é um presente para os brasilienses - nativos ou adotivos. A câmera de Truman Macedo captura imagens vastas do cerrado - mato e céu, árvores e flores, pássaros e outros bichos. E vai colocando tudo isso em perspectiva quando invade o espaço urbano, com um olhar instigante, ora amoroso, ora crítico, do cotidiano da cidade, que espreme a natureza em espaços de confinamento dos quais ela parece sempre a ponto de escapar.

Logo de início, o autor estabelece o contraste como componente importante de seu trabalho fotográfico, ao contrapor a amplidão do cerrado - sob a inscrição "O azul sereno do nosso céo." (L.F. Cruls, 1892) e a limitação opressiva do famoso "Buraco do Tatu", trecho subterrâneo da Rodoviária de Brasília, também denominado "Marco Zero" da cidade. E o contraste valoriza todas as fotos: entre o claro e o escuro, entre o nítido e o embaçado, entre o verde e as cores vivas de flores e pássaros, entre o céu e o concreto dos monumentos, entre o distanciamento e a proximidade dos detalhes.

Junto com as fotos, o livro traz apresentação e poemas de Nicolas Behr, cuja poesia nos faz ver a Brasília concretamente monumental como um espaço que se humaniza e acolhe aqueles que nela habitam, que nela assistem ao teatro da política, que nela convivem com a diversidade, a pluralidade e os dramas produzidos pelas agudas desigualdades e diferenças.

que cidade é essa
que vejo - espelho -
do avião?

que cidade é essa
que sangra - vermelho
da cruz?

que cidade é essa
que amo
mais do que eu?

                   (Nicolas Behr)

Na organização das fotos no livro, Truman Macedo utiliza também trechos dos textos que registram o processo de escolha do território que sediaria a capital do Brasil, como os da Missão Cruls (primeira e segunda) e da profecia de Dom Bosco. São fragmentos de registros das preocupações que remontam ao século XVII, quando João Fernandes Vieira sugere que os habitantes de Pernambuco construam sua sede em terras "as mais longes do mar" - essa que acaba por dar título à linda homenagem desse cearense a Brasília.

O livro intercala as fotos com explicações escritas pelos próprios idealizadores de Brasília, como é o caso do texto de Lúcio Costa, que nos faz entender a interação das quatro escalas urbanas que compõem a cidade: a monumental, a residencial, a gregária e a bucólica. Quantos de nós, brasilienses nativos ou de coração, conhecemos essa explicação?

As fotos de Truman Macedo ora velam, ora desvelam ângulos conhecidos dos brasilienses. Ora desvendam, ora propõem adivinhações, como esta:


Em outros momentos, vemos a vida de dentro de situações prosaicas do cotidiano, quando então temos a certeza de que esta cidade se constrói e se constitui por seres humanos, muitas vezes maltratados pela precariedade do transporte público. Ainda assim são vistos poeticamente pela lente amorosa de Truman Macedo:



O fotógrafo flagra tanto a natureza quanto as estruturas de concreto, quanto as pessoas; flagra tanto os monumentos quanto os detalhes irrelevantes deles, atribuindo-lhes clareza e importância no todo monumental da capital brasileira:


Enfim, "As mais longes do mar" é um belíssimo livro sobre Brasilia, seus ambientes, sua natureza, seus homens e mulheres, seus percursos e trajetórias, suas particularidades arquitetônicas e urbanísticas. Tudo isso é visto pela lente sensível e carinhosa de um habitante que ama sua cidade.

Se você quiser informações sobre como adquirir este belo livro, faça contato comigo na caixa de comentários.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

O tédio, a mídia e o nojo

 
Sabe quando você tem a sensação de que alguma coisa, que sempre fez por prazer e interesse, de repente virou obrigação e perdeu a graça? É o que está acontecendo comigo, em relação aos noticiários de televisão. Todos os dias, talvez por força do hábito, assisto a uns três programas de notícias. Mas isso tem se tornado uma atividade cada vez mais entediante, quando não indignante.

Vamos aos porquês.

Nos dois últimos anos, passei um total de quase seis meses fora do Brasil. Tive a oportunidade de conhecer a imprensa de alguns outros países, inclusive aqueles da Europa no início da atual crise econômica. Vi ali o mesmo processo de manipulação da informação, a imprensa como cúmplice das autoridades políticas que impuseram aos povos espanhol e português o amargo pacote das tais medidas de austeridade, exigidas pela Troica - Banco Central europeu, FMI e União Europeia - para que esses países recebessem ajuda financeira. "Troica" era a palavra mais ouvida nos noticiários, que convocava seus "especialistas" para afirmar que as tais medidas eram necessárias para o enfrentamento da crise do capitalismo. Bem, isso foi em 2011 e até hoje os portugueses e espanhóis, arrochados pela austeridade fiscal e monetária de seus governantes, não lograram superar a tal crise.

 Emissários da Troica: já vimos muitas vezes essa cena no Brasil...

Ano passado, estive na Austrália. Coincidência: o período era de eleições e a primeira-ministra, Julia Gillard, concorria à reeleição. Não vi ataques ferozes da mídia a ela, mas sim o debate de temas caros aos australianos, que eram colocados em pauta pela candidata ou por seu opositor. Vejam a diferença: pelos candidatos. A partir deles, toda a mídia discutia o tema pautado. E essas discussões foram evidenciando a inconsistência das propostas neoliberais do candidato da oposição, que terminou perdendo a eleição. Isso porque os australianos quiseram garantir a continuidade das políticas sociais implementadas pelos trabalhistas. Conversei com mais de uma pessoa que elogiou as medidas assistenciais implantadas pelo governo, de proteção aos mais pobres, aos desempregados e aos aposentados. E várias outras, como por exemplo aquelas destinadas aos jovens que iniciam a vida de trabalho.

Mas. (Sempre há um "mas"...)

Tudo isso me ocorre hoje, depois de assistir pela enésima vez a uma matéria sobre o risco de racionamento de energia elétrica aqui no Brasil. O estardalhaço da mídia - minha avó diria "o frege" - quer me convencer de que VAI HAVER o tal racionamento. E, de quebra, a tão propalada redução nas contas de luz não vai ocorrer. Vi isso na Globo, na Band e na Record. Os "especialistas" convidados são sempre os caras que endossam as teses dos noticiários. A Band chegou ao cúmulo de entrevistar um diretor da CPFL - empresa paulista que se opôs ao projeto do governo federal de redução das tarifas de energia. 
 
Miriam Leitão faz escola: a prática da urubulogia está se disseminando na mídia brasileira. Proliferam os jornalistas metidos a entender de todos os assuntos. Muitos deles fazem cursos de pós-graduação e, como prêmio, recebem bolsas de estudos do Instituto Milenium e da Sociedade Interamericana de Imprensa, bastiões do pensamento da direita latino-americana (se é que se pode chamar toda essa tosquice intelectual de "pensamento"!) Na América Latina, a mídia, de fato, se transformou em partido político, que leva a reboque políticos de oposição aos governos eleitos democraticamente. No momento, a urubulogia concentra suas agourentas previsões na situação venezuelana: alguns jornalistas nem disfarçam o desejo de que Hugo Chávez morra de vez, antes de tomar posse na presidência da Venezuela.

Então. Passada a preguiça, o "boring", vem o nojo - no sentido espanhol da palavra. Por que eu tenho de aturar o Bóris Casoy babando maus agouros no horário nobre? E o arzinho de revolta alarmante do William Bonner? Ora pois!

Que nojo essa mídia e seus colunistas me provocam - com poucas exceções!  É esse nojo que acende minha indignação e renova minha disposição de continuar lendo e combatendo essa cambada de gente antipovo, antiBrasil, antidemocracia!