Inicio agradecendo aos leitores que comentaram o post anterior, sobre mobilidade urbana. É bom ver que há pessoas que compartilham de nossas ideias e contribuem para aprimorá-las. Prossigo agora com algumas reflexões sobre a saúde pública para uma capital federal do terceiro milênio.
Fiquei revoltadíssima, ano passado, quando li matéria da CartaCapital informando que alguns governos estaduais foram pegos em auditoria do Ministério da Saúde, que flagrou recursos do SUS, repassados pelo governo federal, aplicados em contas bancárias de Minas Gerais, São Paulo, Brasília e Rio Grande do Sul. Governos demotucanos, que "coincidência"! Vejam o que diz a matéria sobre Brasília:
"O primeiro caso a ser descoberto foi o do Distrito Federal, em março de 2009, graças a uma análise preliminar nas contas do setor de farmácia básica, foco original das auditorias. No DF, havia acúmulo de recursos repassados pelo Ministério da Saúde desde 2006, ainda nas gestões dos governadores Joaquim Roriz, então do PMDB, e Maria de Lourdes Abadia, do PSDB. No governo do DEM, em vez de investir o dinheiro do SUS no sistema de atendimento, o ex-secretário da Saúde local Augusto Carvalho aplicou tudo em Certificados de Depósitos Bancários (CDBs). Em março do ano passado, essa aplicação somava 238,4 milhões de reais. Parte desse dinheiro, segundo investiga o Ministério Público Federal, pode ter sido usada no megaesquema de corrupção que resultou no afastamento e na prisão do governador José Roberto Arruda."
Pois é. Agora leio no Correio Braziliense de ontem que o novo governador do DF negociou com o Ministério da Saúde e, em vez de o governo federal retomar os recursos, deu prazo para que o GDF lhes dê sua verdadeira destinação: melhorar os serviços prestados pelos hospitais públicos de Brasília, nos quais falta de tudo: equipamentos (muitos estão armazenados em suas embalagens há mais de dois anos), médicos, enfermeiros, auxiliares, remédios, leitos, instalações adequadas etc.
O que se deve fazer primeiro é uma compra emergencial de tudo o que falta. Há pouco tempo uma mulher, minha conhecida, relatou-me que não pôde fazer o exame de prevenção contra câncer de útero por falta de - pasmem! - uma espátula para coleta de tecido epitelial. Da mesma forma, nas unidades de saúde, o atendimento odontológico está parado por falta de material. Penso então que há essa situação urgente a ser resolvida, para dar condições mínimas de trabalho às equipes de saúde.
Feito isso, há que se pensar em programas de promoção da saúde da população, pois não há nenhum funcionando. Pelo menos, não oficialmente. Alguns poucos funcionam, muito mais devido à abnegação e ao comprometimento dos profissionais do que por estímulo do poder público. Ou seja, funcionam apesar do poder público...
Daí que acho bom pensar em como deveria ser esse atendimento. E aí, a palavra chave que aparece, de uma prática responsável pela precarização dos serviços públicos em geral, é terceirização. A primeira coisa a ser feita é extinguir contratos de terceirização dos serviços de saúde, como o escandaloso negócio feito por Augustus Camaleonicus com uma certa Sociedade Real Espanhola, contratada sem licitação para gerir o Hospital de Santa Maria.
Deve-se buscar a descentralização máxima da saúde pública, com a adoção das UPAs, nos moldes propostos pelo governo federal, em todas as regiões do DF. E também dotar os grandes hospitais com recursos para pesquisas que lhes permitam criar centros de excelência em oncologia, transplantes e tratamento de doenças crônicas em geral.
Tudo isso deve ser acompanhado de um processo incessante de profissionalização do atendimento, com investimento na formação e qualificação de profissionais da saúde, com política de pagamento de bons salários para fazer com que médicos, dentistas, enfermeiros, técnicos sintam-se comprometidos com sua nobre missão de cuidar da saúde da população, com salários dignos, compatíveis com a sua função social.
O DF tem orçamento generoso, ou melhor, dois orçamentos: o do Fundo Constitucional e a arrecadação própria de suas receitas como estado e município - R$ 26,7 bilhões para 2011. É inaceitável que, com toda essa grana, seja mau prestador de serviços públicos, permitindo que os casos de dengue tenham aumentado este ano. E é ainda mais inaceitável que a população mantenha no poder os governantes que desviam recursos, por exemplo, para construção de obras monumentais, como ocorreu para que Brasília tivesse a Ponte JK, cujo nome deveria ser, na verdade, "Ponte dos Remédios" - foram R$ 160 milhões, a preços de 2002, grande parte deles usurpados da saúde pública. Que não voltem mais os rorizes, arrudas e quetais...
Para finalizar, seguindo a máxima de que "recordar é viver", deixo com vocês um filminho de conhecido programa local de TV, sobre a saúde pública no DF.