sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Eu não te perdoo, Arruda!!!


Indignação.

Esse é o sentimento que me assalta quando vejo as imagens do discurso de José Roberto Arruda, governador do DF pelo DEM, atolado até o pescoço em denúncias gravíssimas de caixa 2:

"Perdoo, a cada dia, os que me insultam. Entendo as suas indignações pelas forças das imagens. E, sabem por que eu perdoei? Porque só assim eu posso também pedir perdão dos meus pecados" (Clique aqui para ver o vídeo com o discurso na íntegra, se você tiver estômago forte)

Esse foi um discurso feito para professores, durante cerimônia de posse dos diretores eleitos nas escolas da rede pública. Discurso para educadores, certo? Eu não ouvi nenhuma vaia. E você?

O que tem ele a nos perdoar? O que foi que você, eu... nós fizemos para merecer o magnânimo perdão do governador? Está ele invertendo a máxima de São Francisco de Assis, "é perdoando que se é perdoado"? É possível tanto cinismo, tanta cara-dura?

Esse homem, quando não está chafurdando em denúncias, age como rei, com o beneplácito da imprensa, que festeja todas as suas ações. Encena o déspota esclarecido, mas não passa de um demagogo assistencialista:

Um mentiroso contumaz

Com direito a páginas amarelas na VEJA, que o saudou como a mais nova promessa para a sucessão presidencial (o grande mico jornalístico do ano passado!). Outros jornais enalteceram suas realizações: o maior número de obras em andamento, por um só administrador, no país. Destaque para o centenário Correio Braziliense, que, depois do escândalo, conseguiu transformar Arruda em sujeito oculto, como bem disse o prof. Venício Lima, da UnB. Todos se esqueceram, apenas, de dizer que para cada obra, das mais de 100 em andamento, a quadrilha liderada por ele tinha um quinhão a receber.

Flagrado, saiu-se com a pérola de que o dinheiro se destinava à compra de panetones para o Natal dos carentes. Depois tomou chá de sumiço e articulou base de apoio na Câmara Legislativa do DF, para garantir a rejeição dos pedidos de impeachment lá protocolados. Exonerou dois secretários para voltarem à CLDF. Na próxima segunda, dia 11, não será surpresa se todos os parlamentares flagrados pelas câmeras do escândalo se apresentarem para o início dos trabalhos. Trata-se de garantir a folgada maioria para Arruda. E somente eles sabem que preço está sendo pago por isso.

Sinto-me enojada, no sentido espanhol da palavra. Não é um mal-estar daqueles que fazem que você se recolha e fique horas debruçado sobre o vaso sanitário. É um mal-estar impulsionador de alguma ação, é um misto de nojo, indignação e vontade de dar um basta.

Eu não votei em Arruda. Jamais votaria nele, por ser do DEM e por ter uma folha-corrida que incluía a violação do painel eletrônico de votações do Senado, junto com o famigerado ACM. Agora acho que os brasilienses que deram a ele seu voto, junto com sua confiança, devem se mobilizar para exigir que seja cassado, e também o vice-governador Paulo Octávio, outro beneficiário do esquemão. E também os deputados e deputadas envolvidos na falcatrua mais fenomenal de que se tem notícia no Brasil.

Segunda-feira, dia 11/01, às 10 h, tem manifestação em frente à Câmara Legislativa do DF.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Nova pesquisa

Estou começando um novo trabalho de pesquisa, que deve resultar em mais um livro, a ser publicado em 2011, se tudo correr dentro do esperado.

O que me motivou foi uma frase do professor Antônio Olavo, quando entrevistado no documentário
Sobreviventes - Filhos da guerra de canudos, de Paulo Fontenele (veja o trailer aqui):

"- É uma tradição da elite brasileira cortar as cabeças das lideranças populares. Foi assim com Tiradentes, com Zumbi dos Palmares, com Lampião e com Antônio Conselheiro."

Resolvi, então, voltar a ler
Os Sertões, de Euclides da Cunha, e me detive nas numerosas cenas de degola que ele descreve. De homens e mulheres, jovens e velhos.

Foto-símbolo de Antonio Olavo

No caso desse livro, há uma intenção explícita do autor de fazer a denúncia da barbárie que vitimou toda uma população. Canudos era, então, a segunda maior cidade da Bahia, com 25 mil habitantes, atrás apenas da capital.


Há obras literárias em que não há explicitação do desejo de denunciar esse ato bárbaro, mas ele está lá presente. Acontece em romances históricos de Érico Veríssimo, por exemplo.

Por isso resolvi investigar como as obras literárias captam esses momentos da vida social. Eles existem historicamente e, como a literatura está em relação com o chão social em que é produzida, não pode deixar de dar a ver esse processo, mesmo quando o oculta. Esses momentos são formas objetivas da realidade e, como tal, são também componentes da matéria que produz a literatura e é produzida por ela.

Aprendi com o mestre Antonio Candido que pode haver uma linha de continuidade histórica da violência do processo civilizatório brasileiro que é captada pela literatura. Essa violência vai, ao longo dessa linha, mudando de configuração: de tosca e brutal na luta de classes explícita a refinada e subliminar no estágio do capitalismo desenvolvido.

Vou, então, delinear essa linha de continuidade por meio das obras literárias, desde Euclides da Cunha até a década de 70. A degola, mas não apenas ela - também o esquartejamento, o enforcamento - é um ato simbólico, cuja exemplaridade visa a manter o populacho intimidado e domesticado. Cortar a cabeça é eliminar a parcela pensante de um corpo; matar um líder popular é eliminar a "cabeça" de um movimento social.

Se formos estudar as rebeliões e os levantes populares no Brasil, veremos que a repressão pela violência é uma constante. Meu livro será sobre a violência como forma objetiva captada pela literatura e a degola será um dos seus tristes capítulos.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Hoje quero refletir aqui sobre três assuntos que mantém estreita relação entre si.

Primeiro: ontem saiu a notícia da morte de um certo Coronel Erasmo Dias, aos 85 anos, de câncer. Postei no Blog do Nassif o seguinte comentário:

"Pois é… Mais um que morre sem prestar contas por seus mandos e desmandos. Caberá ao diabo criar o tribunal de exceção para julgar os crimes da ditadura?"

Recebi dele a seguinte resposta:

"A não ser o abuso da invasão da PUC, nunca vi seu nome associado a torturas. No fundo era um falastrão, que parava o trânsito de madrugada apenas para se exibir para namoradas."

Depois, Mário Siqueira postou também o seguinte:

"Falastrão, Nassif ?
Ele foi Secretário da Segurança Pública de 1974 a 1979.
Nesse período morreram em SP, na prisão, entre outros, Wladimir Herzog e Manuel Fiel Filho, só para lembrar os mais conhecidos."

Depois, em outro comentário, alguém também lembrou que o Cel. Erasmo Dias aproveitou-se do cargo para conseguir que o IML de São Paulo "legalizasse" as mortes ocorridas nos cárceres da tortura.

Eu, muito particularmente, guardo em algum canto seguro uma caixa de foguetes. De vez em quando um deles pipoca. Mas eu confesso que, antes de todos os meus foguetes pipocarem, gostaria de ver todos os cúmplices da ditadura empresarial-militar responderem por seus atos. E sigo repetindo as histórias por aí, porque o esquecimento é a arma com que contam os covardes para ficarem em paz.

Segundo assunto: o golpismo do Ministro da Defesa, Nelson Jobim, que vazou relatório sigiloso da FAB sobre a compra de aviões para as forças armadas, criando um factóide que a mídia, também golpista, está explorando à exaustão, inclusive com direito a publicação de mentiras nas colunas assinadas, como a última da Eliane Cantanhede. (Não coloco o link aqui porque não acesso esse lixo que é a
Folha de S. Paulo, apenas leio esse jornalismo de esgoto quando suas matérias são destacadas nos blogs que frequento).

Ao colocar Lula contra a parede no caso dessa compra (de passagem, diga-se que o avião sueco preferido pela FAB é apenas um projeto e a transação não prevê transferência de tecnologia para o Brasil), o ministro ajudou os comandantes militares a retaliarem o governo, por causa do Plano Nacional de Direitos Humanos, pois eles são contra a criação daquela comissão que trabalhará na apuração dos crimes dos torturadores durante a ditadura civil-militar.

Sigamos com atenção o desenrolar dessas situações, para termos noção do quanto podem radicalizar no golpismo o ministro, os militares e a mídia.

Terceiro assunto: recebo por e-mail a notícia (clique aqui para ler) de que Cristina Kirchner, presidenta da Argentina, assinou hoje o decreto nº 4/2010, que obriga à abertura dos arquivos relacionados à atuação das forças armadas daquele país durante a ditadura militar que governou o país de 1973 a 1986.

Esse eu coloco aqui só para dar um gostinho de quero-mais, para nos animar a lutar pela mesma coisa aqui no Brasil.

Isso também será difícil, porque haverá a mídia dizendo que é preciso esquecer tudo para se conseguir a paz e a harmonia; haverá o Boris Casoy trovejando que "isso é uma vergonha" e haverá o mesmo ministro Jobim dizendo que é "revanchismo".

Li na Carta Maior uma carta aberta de Alípio Freire ao Secretário de Direitos Humanos Paulo Vanucchi, na qual ele define o que seria revanchismo:

"seria pretender que os acusados (diretos ou indiretos) de crimes de tortura fossem seqüestrados, levados para cárceres clandestinos onde permaneceriam desaparecidos durante o tempo que melhor aprouvesse aos seus seqüestradores; onde seriam interrogados sob as mais aviltantes torturas; e, depois, aqueles que sobrevivessem aos meses de incomunicabilidade e sevícias, que sobrevivessem ao chamado 'terror dos porões', fossem submetidos à farsa burlesca do julgamento nos tribunais de guerra."

Estão aí os assuntos. Reflexões sobre eles serão bem recebidas, para que este deixe de ser o blog mais estranho da web, em que há leitores mas quase não há comentários sobre os textos aqui postados.

Para refrigerar o clima um pouco, depois de assuntos tão pesados, fiquem com uma bela foto de namorados:


Brisbane, Austrália, outubro/2009

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Bônus demográfico

Você sabe o que é bônus demográfico?

Eu soube hoje, no blog do Nassif, quando ele comentou matéria d'
O Estado de São Paulo, relatando que se trata "de um período no qual a população economicamente ativa supera largamente a de dependentes, composta por idosos e crianças. Segundo especialistas, é uma condição propícia ao desenvolvimento de uma economia."

Diz o jornal que essa situação é algo raro na história econômica de um país. É uma "janela de oportunidade" para o crescimento econômico e acontece apenas uma vez. É como naqueles filmes em que há um portal para outra dimensão: se o herói perde o
timing, o portal se fecha e ele fica preso para sempre em uma dimensão inferior. Para aproveitar bem o bônus econômico, o país tem de "absorver a mão de obra disponível e incentivar as potencialidades da alta proporção de pessoas capazes de contribuir para a elevação da produção e da produtividade.”

A notícia boa é que o Brasil tem hoje 67,6% da população no grupo das pessoas aptas a ingressarem no mundo do trabalho, contra 32,4% de crianças e idosos, ou seja, aqueles que ainda não podem produzir e os que já deixaram seus postos de trabalho. A estimativa é que em 2020, a população trabalhadora atinja 70,4% do total da população brasileira. É um cenário futuro muito promissor, se o país souber aproveitar o bônus demográfico. Para isso, tem de investir na criação de empregos, na educação e na saúde dos brasileiros.

Notícia boa, não? Deixou-me animada e esperançosa.

Também me fez refletir. O próximo ano é de eleições para presidente e governadores. Dos candidatos autodeclarados, não declarados e totalmente no armário, tanto para o executivo federal quanto para os estaduais, preciso escolher aqueles cujo compromisso com esse investimento vá além da retórica de campanha.

Não será suficiente o discurso da competência, porque esse é facilmente desmascarado pelas notícias sobre como os governadores vem atuando nas mais diferentes situações, especialmente aquelas mais aflitivas para os cidadãos pobres. Poses marqueteiras estão dispensadas, o que vai contar é o trabalho e o resultado efetivo dele. Palavrório como "choque de gestão", "choque de capitalismo", "estado paquidérmico", essas coisas típicas do neoliberalismo, não cola mais.

Papo de experiência, como o que Serra usou contra Lula na campanha passada, esse não cola mais também. Lula provou que, mesmo sem experiência em poder executivo e com toda a mídia contra ele, é possível fazer um bom governo. (Claro que com muitas ressalvas: bom quando comparado com os que o antecederam no período pós-ditadura, dentro das regras da democracia burguesa. Mas, para minhas aspirações, teria que ser revolucionário mesmo, fazendo a reforma agrária e quebrando de vez privilégios históricos.)

Então está aí um dado para que comecemos a pensar, enquanto o bolo alimentar dos panetones mal-digeridos teima em nos dar azia.

domingo, 3 de janeiro de 2010

A nota triste do feriadão de ano novo

Notícias das Minas Gerais informam sobre fortes temporais. Do interior de São Paulo também. E do Rio de Janeiro, vem o desespero e o luto de Angra dos Reis. Há muitas inundações, muitos deslizamentos de terra, muitas mortes e muitos desabrigados.

Há a pequena cidade de São Luiz do Paraitinga (SP), que teve uma linda igreja derrubada e todo o casario antigo do centro invadido pelas águas. Muita gente desabrigada, muita tristeza e desespero.

Isso sem falar nas inundações que vêm ocorrendo desde o final do ano passado, em Minas e na capital paulista. Os moradores do Jardim Pantanal, até hoje, não se livraram da água em suas ruas. Estão sendo assediados pela prefeitura da Capital para aceitarem R$ 5.000,00 e abandonarem suas casas. Há famílias que moram lá há muito tempo, mais de 20 anos.

Minas Gerais também tem sofrido. Juiz de Fora, Raposos e São Tomé das Letras, além de Belo Horizonte, sofreram as consequências das fortes chuvas. 37 cidades em situação de emergência, 80 pontes destruídas parcialmente e 44 derrubadas totalmente. Milhares de pessoas desalojadas temporariamente e desabrigadas.

Começa a se mobilizar a corrente de solidariedade dos brasileiros, a mandar roupas e alimentos para essas regiões. Isso me encanta no meu povo: essa disposição para ajudar outros brasileiros em situação de desespero!

(Faço questão de esquecer, nesse quesito, o "flagra" de desvio das doações ocorrido em Brasília ano passado, por ocasião das calamidades em Santa Catarina. Brasília é um caso a parte, qualquer dia volto a falar dessa aptidão "natural" para desviar recursos...)

Entra ano, sai ano, essas notícias se repetem. Encostas continuam sendo desmatadas, rios continuam sendo assoreados, bairros brotam em várzeas de rios. E a calamidade se repete, mais grave a cada ano.

Interessante observar, nos noticiários, a atuação do poder público. Em Angra dos Reis, algumas horas após os primeiros desabamentos de encostas, estavam lá o coordenador da defesa civil do estado, o vice-governador e, mais algumas horas depois, o próprio governador, que pediu aos turistas que saíssem da cidade, dado o perigo de novos acidentes.

Em Minas Gerais, apenas a defesa civil. Mobilizaram-se os prefeitos das cidades atingidas, em desespero, implorando pelo apoio do governo estadual. Em São Paulo, na capital, ausência total do prefeito e do governador. Não era com eles. A defesa civil agiu, mas era insuficiente para tanta tragédia. No interior, nem pense que houve alguma ajuda do governo estadual, pelo menos até o momento em que escrevo este post.

Em contrapartida, a ajuda do governo federal foi determinada antes mesmo de ser solicitada pelos governos estaduais.

Tudo isso está nos jornais que li durante o fim de semana prolongado. As cidades estão literalmente se afogando nesses estados.

Enquanto isso, Brasília segue soterrada por panetones...