quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Já passa da hora!!!!

O Brasil, diferentemente da Argentina e do Chile, ainda não começou a passar a limpo o período da ditadura militar. Ainda não responsabilizou lideranças militares e civis pelo golpe empresarial-militar que se abateu sobre o país em 1º de abril de 1964. Ainda não recontou a história oficial pela ótica das famílias que perderam seus filhos na luta contra o arbítrio e o autoritarismo. Ainda não puniu os torturadores e assassinos que, em nome do combate ao comunismo, trucidaram homens e mulheres que lutavam pela democracia.
E quando surge qualquer iniciativa para dar início a esse ajuste de contas, as reações são iradas e irracionais. Os apoiadores da ditadura estão ainda hoje na ativa, no Congresso Nacional, no Executivo e no Judiciário. É preciso tornar público o passado daqueles que se beneficiaram do regime, denunciá-los como cúmplices de crime de lesa-humanidade, que é imprescritível.
Fiquemos atentos, porque deu na Folha de São Paulo de hoje:

Contra "Comissão da Verdade", comandantes ameaçam sair

Exército e Aeronáutica dizem que plano para apurar tortura na ditadura é revanchista

Secretário de Direitos Humanos também diz que se demite se houver recuo; Lula deve deixar decisão de impasse para volta de férias

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
SIMONE IGLESIAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os comandantes do Exército, general Enzo Martins Peri, e da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, ameaçaram pedir demissão caso o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não revogue alguns trechos do Plano Nacional de Direitos Humanos 3, que cria a "Comissão da Verdade" para apurar torturas e desaparecimentos durante o regime militar (1964-1985).
Em reunião com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, no dia 23, às vésperas do Natal, os dois classificaram o documento como "excessivamente insultuoso, agressivo e revanchista" às Forças Armadas e disseram que os seus comandados se sentiram diretamente ofendidos. O comandante da Marinha, Júlio Soares de Moura Neto, não estava em Brasília.
Jobim disse que não tinha sido consultado sobre os termos do plano, que não concordava com tentativas de revanchismo e que iria falar com Lula a respeito. Com isso, acabou colocando o presidente entre dois polos de pressão: os militares, de um lado, e o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o secretário de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, do outro.
Lula embarca hoje para a folga de fim de ano na Bahia procurando uma solução de contemporização. Os militares se contentariam com mudanças no texto, mas Vannuchi está irredutível e também ameaça sair do governo caso haja recuo.
Até ontem, a opção de Lula para minimizar a crise era uma saída de meio termo: não mexer no texto, mas orientar as comissões técnicas encarregadas de executá-lo a ignorar na prática os pontos mais críticos.
À Folha, um alto funcionário civil disse que a "tensão está fortíssima". Esse clima ficou evidente na cerimônia que Lula presidiu anteontem, no CCBB, para sancionar a nova lei de cargos e salários dos taifeiros da Aeronáutica, na presença de Saito, que conversou à parte com o presidente.
Convidado por Lula, Jobim disse que não poderia comparecer à cerimônia porque estaria fora de Brasília. Quem acabou aparecendo, para um evento da Funai, foi Tarso Genro. Também conversou reservadamente com o presidente.
Vannuchi está no olho do furacão: ele tinha despacho com o presidente às 18h do mesmo dia, mas o encontro foi adiado de última hora para ontem e, no final, acabou não acontecendo, o que aumentou a suspeita de que ele também tenha colocado o cargo à disposição.
Lula conversou com Vannuchi por telefone e lhe falou sobre a "fórmula de conciliação", mas o desfecho ficará para a volta de Lula, em 11 de janeiro.
O foco da crise é o sexto capítulo do Plano de Direitos Humanos, anunciado por Lula no dia 21 e publicado no "Diário Oficial" da União, no dia seguinte, com 180 páginas.
O capítulo se chama "Eixo Orientador 6: Direito à Memória e à Verdade". Duas propostas deixaram a área militar particularmente irritada: identificar e tornar públicas as "estruturas" utilizadas para violações de direitos humanos durante a ditadura e criar uma legislação nacional proibindo que ruas, praças, monumentos e estádios tenham nomes de pessoas que praticaram crimes na ditadura.
Na leitura dos militares, isso significa que o governo do PT, formado por muitos personagens que atuaram "do outro lado" no regime militar, está querendo jogar a opinião pública contra as Forças Armadas.
Imaginam que o resultado dessas propostas seja a depredação ou até a invasão de instalações militares que supostamente tenham abrigado atos de tortura e não admitem o constrangimento da retirada de nomes de altos oficiais de avenidas pelo país afora.
Em Brasília, por exemplo, há a ponte Costa e Silva e o Ginásio Presidente Médici -ambos presidentes no regime militar.

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