sexta-feira, 27 de maio de 2011

"Nenhum minuto de silêncio, mas toda uma vida de luta"

Tento resistir a usar apenas uma palavra para designar meu sentimento pelos acontecimentos recentes na velha guerra que se desenrola no campo brasileiro: vergonha.

Antes que me refizesse do impacto causado pela notícia do assassinato de José Cláudio e Maria do Espírito Santo, a mando de madeireiros, em Nova Ipixuna, no Pará, chega-me a informação de que ocorreu, hoje, outro assassinato: desta vez a vítima foi Dinho, sobrevivente do massacre de Corumbiara, em 1995. Dinho foi pego de surpresa pelas balas de um motoqueiro, enquanto vendia verduras perto do acampamento onde vivia com a família, na região de Porto Velho (RO).

Os companheiros dos movimentos sociais do campo realizaram manifestação na manhã de hoje na ponte rodoferroviária Carajás, sobre o rio Tocantins, em Marabá (PA), sem imaginar que poucas horas depois estariam perdendo mais um companheiro que também vinha denunciando a ação de madeireiros na região em que vivia.


Só me resta utilizar este modesto espaço de reflexão para protestar com todas as forças contra as mortes dos companheiros que lutam pela justiça no campo, e contra a repetição incessante das circunstâncias dos assassinatos. Sempre a mando da mais arcaica e atrasada modalidade de posse da terra, desde sempre na história das relações sociais brasileiras: o latifúndio.

Ou será que alguém pensa que a indústria do desmatamento não tem vinculações com os grandes proprietários de terra, aos quais interessa substituir a cobertura vegetal da região norte por capim, para alimentar as centenas de milhares de cabeças de gado que usam para ocupar ilegalmente as terras? Parece-me, inclusive, que essas mortes foram impulsionadas pela recente vitória dos ruralistas na votação das emendas ao código florestal brasileiro. Essa turma deve estar se sentindo mais poderosa do que a justiça que deixa impunes os mandantes dos assassinatos. E a impunidade é o mais claro sintoma da barbárie que se instala com estardalhaço nas relações sociais arcaicas predominantes no campo.

Impossível ficar indiferente a tanto descalabro. Enquanto nossa imprensa desvia o foco para a pretendida inadequação dos livros didáticos oferecidos pelo MEC, a guerra corre solta, cada dia com violência maior, naquele Brasil desconhecido da maioria dos brasileiros urbanos, que convenientemente não tomam conhecimento da violência e da truculência com que o latifúndio - hoje elegantemente denominado agronegócio - elimina seus opositores.

Não há minuto de silêncio dedicado a José Cláudio, Maria do Espírito Santo e Dinho; há sim a intensificação da luta pelos ideais que defenderam junto com seus companheiros e companheiras que, em todo o país, lutam pelo direito a terra, pão e trabalho.


A todos os meus amigos e amigas do MST e de todos os movimentos sociais do campo, minha irrestrita solidariedade em mais este momento de dor pela perda de tão valorosos militantes.

2 comentários:

Rogério Fernandes Pereira disse...

Olá Bel, acho que a tecnologia está nos aproximando mais do que uma festa de família né? :)
Minhas considerações a respeito do assunto, e gosto muito de tocar nisso, pois a mudança precisa começar de alguns poucos e assim evoluir para a sensibilização de uma parte maior. Estimular a educação, um ingrediente que tem muito a melhorar em nosso país.
Vejo a impunidade nesse país com muita decepção, às vezes até com vergonha de ser brasileiro, pois a maioria prefere continuar na ignorância, correndo atrás de futebol, big brother, carnaval, se contentando com as manipulações da impressa marrom, como a "Globo", e não enxergam o que de fato está por trás das desigualdades sociais do nosso país. Não percebem que tem "peixe grande" conduzindo a situação de tal forma, com objetivo de ficarem na mordomia as custas do povo tapado. O sociedade brasileira "classe média" não entendeu, ou se faz de desentendida, que por trás de uma "Globo" e outras, existem muitos que não querem a igualdade social e usam a política do "pão e circo" pra manter a popuação anestesiada olhando para o seu próprio umbigo, longe das discussões, usando uma estratégia vil e condenável das distorções. Dá impressão que o jornalismo dessas redes é burro, o que não acredito. A última instância que ainda podíamos confiar era a justiça, mas essa tem se mostrado incompetente e conivente em muitos campos. Tenho o exemplo de ter em um determinado município que morei muitos anos, onde o MP na figura de um promotor foi "comprado" pela administração municipal, havendo até uma inversão de papéis, manchando toda a instituição. Isso mostra que em nossa região amazônica é o velho "Faroeste Caboclo" de "Joâo de Santo Cristo" do Legião Urbana, onde o foco não é o tráfico, mas o latifúndio. Depois dessa lei aprovada, houve um aumento de sentimento de poder por parte dos ruralistas, que como comentado nesse blog lançam mão de ações retrógradas e inaceitáveis, para eliminar a força bruta qualquer coisa que venha a ser contrária, estando inclusive acima da Constituição Federal. A sociedade (classe média) não se envolve, pois não está em discussão, já que a imprensa não dá devida importância. Se cai uma criança do terceiro andar, mesmo que por acidente, querem linchar os pais, ou se seu time perde querem invadir o clube e linchar os jogadores, mas se morre um "homem do campo", nem se interam do que aconteceu, "não temos nada haver com isso"! Cada vez mais a sensação de impunidade nesse país fica mais forte e com isso elementos mais ousandos irão fazer mais sujeira de forma ousada. Penso em meu mode de ver e entender as coisas, que agora a justiça deveria agir com rigor e ter a oportunidade de reverter a opinião de que esse é o "país do samba", aliás "da pizza" e nos fazer novamente orgulhosos de sermos brasileiros! Coloco um link da Dep. Cidinha Campos do RJ desabafando sobre impunidade! Link: http://www.youtube.com/watch?v=PjIoT21m2sk

Anônimo disse...

Enquanto a midia e a oposição canalizam suas energias em cruzadas morais e firulas ambientais,com claro objetivo de imobilizar e desgastar o governo, a selvageria patrocinada por poderosos nos campos (desmatamentos e violencia contra trabalhadores) e cidades (transporte individual e degradação ambiental da vida urbana) é cada vez mais intensa.
Cegueira social e hipocrisia andam juntas.